Estrangeiro será termômetro para ativo local

Transição política e cena externa são pontos de atenção, mas fluxo pode dar impulso a ‘kit Brasil’ 

Por Adriana Cotias

Em meio a dúvidas sobre a transição de governo e o rumo da política econômica brasileira, com o candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) eleito presidente, o investidor estrangeiro tende a ser o fiel da balança para os ativos locais. Entre especialistas em investimentos, há quem considere que é melhor esperar o nevoeiro passar até ter mais visibilidade para assumir posições de maior risco. E há também quem avalie que, se o investidor esticar o olhar para 2023 e adiante, há boas oportunidades a capturar em ações, renda fixa, multimercados e fundos de crédito.

A sucessão ocorre num momento de vento contrário no mercado internacional, com os principais bancos centrais do mundo apertando as condições financeiras, e ainda sob efeitos nocivos da guerra entre Rússia e Ucrânia na inflação. Mas como o Brasil antecipou seu ciclo de aperto monetário, qualquer sinalização em direção à responsabilidade fiscal e uma equipe econômica pró-mercado a partir de 2023 pode engatilhar novas entradas de recursos externos.

Até aqui, o comportamento do capital externo na bolsa local foi bastante pragmático, com a entrada de quase R$ 80 bilhões, melhor desempenho desde 2016. Como outros emergentes se tornaram mercados não investíveis, caso de China e Rússia, e mesmo alguns pares latinos, o Brasil pode se beneficiar do fluxo de fundos dedicados.

“Os estrangeiros não estão preocupados com ruídos, querem saber qual é a ‘big picture’, e estar com exposição abaixo da média neste momento pode ser um grande equívoco”, diz Wilson Barcellos, executivo-chefe da italiana Azimut no Brasil. “Com a expectativa de que a democracia prevaleça, que o ambiente de transição não seja de ruptura e que os aspectos fiscais sejam colocados de forma importante, o fluxo externo vem para cá, todos os ativos estão muito depreciados.”

Para o investidor que não está disposto a sofrer com a volatilidade dessa travessia, a recomendação é ser conservador, se apegar às opções que asseguram os 13,75% da Selic, um retorno não desprezível. “Mas, se tiver um prazo mais dilatado, o preço/lucro [das ações na bolsa] e demais ativos têm uma maior possibilidade de alta do que a taxa de juros do custo de oportunidade. Vale a pena investir em renda variável, tomar um pouco mais de risco olhando para um futuro em que acredite que o governo não vai ser leniente
com o fiscal.” Se o pós-eleição for nesta direção, o brasileiro mais tolerante a risco pode pegar carona no aumento da exposição dos estrangeiros.

Na renda fixa, o executivo da Azimut dá preferência a papéis que garantam juro real, como as Notas do Tesouro Nacional série B (NTN-B), um ativo que protege o investidor de ambientes inflacionários mais adversos. Fundos ativos em renda variável e multimercados são outra forma de facultar aos gestores profissionais a tarefa de fazer posições táticas e estruturais com mais velocidade. “É tudo muito favorável para que coloque ativos buscando retorno mais elevado que o custo de oportunidade, o risco compensa.”


Nas suas estratégias de alocação para os clientes, a Principal Claritas chegou ao segundo turno da eleição com posições leves, abaixo da média de mercado em bolsa, privilegiando os títulos indexados à inflação com vencimento em três a quatro anos, diz Ernesto Leme, diretor comercial da gestora. “São ativos que carregam um prêmio em juro real gordo, pagam inflação mais 5,5%, 6%, é difícil ver uma oportunidade tão grande em termos de juro real no mundo.” Multimercados e fundos de renda fixa com crédito privado sem trava de liquidez compõem a carteira.

Para o executivo, um gatilho possível para as ações é, primeiro, o interesse dos estrangeiros pelos ativos locais, algo a ser monitorado, e segundo, a composição da equipe do presidente eleito. “Eu, particularmente, gosto de mercado de risco a partir desse movimento”, afirma Leme.

O especialista cita que seus pares na Principal Claritas, braço no Brasil do americano Principal Group, estão com o dedo no gatilho para aumentar a exposição em estratégias ligadas a juros nominais, mas ele acha prematuro. Em ativos internacionais, tem uma recomendação “neutra”, e lembra a importância de ter uma posição estrutural lá fora como fonte de diversificação para o portfólio.

A equipe de renda variável da ASA Investments já tinha balanceado sua carteira de empresas de pequena e média capitalização na bolsa para setores que poderiam ser
beneficiados por um novo mandato de Lula, a exemplo da construção civil para a baixa renda, com eventual reativação do programa de habitação popular, e o de educação, pelo
viés do incentivo público para inclusão das classes menos favorecidas, segundo Vitor Facure, cogestor do fundo.

A casa aumentou também a fatia em ações do segmento de óleo e gás com Petro Rio, 3R Petroleum e PetroRecôncavo, que podem sair favorecidas de uma maior interferência do governo na estatal Petrobras, a companhia de referência.

“A gente já tinha uma concentração grande em cíclicos domésticos, independentemente da definição eleitoral, por entender que o juro já fez o pico e vai começar a ver em 2023 a redução das taxas”, afirma Facure.

Num primeiro momento, o gestor vê o capital externo servindo de combustível para ações mais líquidas, que integram o Ibovespa, mas posteriormente pode mudar a chave para os casos domésticos, filtrando as ações de melhor fundamento micro. Vai pesar a seleção o desempenho operacional na temporada de resultados referentes ao terceiro trimestre.

Com um fundo direcional, a gestão da ASA tem mantido uma posição pequena de caixa.

Para a pessoa física que tirou o pé do acelerador em meio à alta de juros, o especialista diz que o melhor momento para voltar para a bolsa será quando tiver melhor visibilidade de quando começa o ciclo de corte da Selic. É preciso também observar os desdobramentos na cena internacional. Uma dúvida é até onde vai o aperto monetário nos Estados Unidos e de outras economias desenvolvidas. Facure acha que pode coincidir de ter um quadro mais claro sobre o fim do processo de ajuste lá fora com o início das reduções no Brasil.

Embora selecione ações para o seu fundo partindo do lado operacional das empresas, Sergio Goldman, da Esh Capital, diz que analistas e gestores são pagos para ler o futuro.

Mesmo ainda faltando ingredientes sobre a condução macroeconômica, ele vê um ambiente positivo para a bolsa em 2023.

“Muita gente diz que tem muita ação barata na bolsa, mas isso é em parte por essa dificuldade de antecipar o cenário de médio prazo.”

No primeiro ano do novo governo, ele espera o encaminhamento de reformas e lembra que as questões internacionais são tão importantes quanto as domésticas. O capital estrangeiro para prosseguir comprando Brasil vai querer escutar qual a estratégia do governo Lula para a economia.

Na carteira, Goldman diz gostar de negócios que estão passando por transformação, evitando posições em papéis cujo “valuation” já incorpore um desempenho muito positivo nos próximos anos. O fundo da Esh tem posições relevantes em saúde, com nomes como Dasa e Fleury. Com a alta recente das ações da Cyrela, o papel passou a ter o maior peso na carteira do fundo.

“É um setor que acredito que vá ser bastante incentivado no médio e longo prazo, porque tem certa oferta para média e alta renda”, afirma o gestor.

No setor financeiro, BTG Pactual, BR Parnters e Itaú são os papéis eleitos, que foram penalizados pelo menor ritmo de operações de mercado de capitais neste ano, diz o gestor. No universo das commodities, a carteira tem Vale, Gerdau e JBS. Com a inflação dando sinais de arrefecimento, as ações de varejo também podem se recuperar, caso de Mercado Livre, Lojas Renner e Pão de Açúcar.

O capital estrangeiro tende a continuar irrigando as ações brasileiras, segundo Roberto Motta, estrategista da Genial. “Em termos relativos, o Brasil dá uma goleada, ganha de 7 a 1 em relação a outras economias”, disse em conferência matinal com investidores. “Ele era indiferente ao candidato ‘A’ ou ‘B’ e não parou de colocar dinheiro. Não mora aqui, não vê as mazelas e o que coloca aqui é uma pimentinha nos fundos dele. Já o local está leve em risco e só vai tomar posição, para o bem ou para o mal, à medida que o gabinete de Lula seja formado.” As paralisações dos caminhoneiros em diversas regiões do país e a demora de Bolsonaro para reconhecer a vitória do oponente são, porém, fatores que pesam contra
no curto prazo.

A Esh Capital não comercializa nem distribui cotas de fundos de investimentos ou qualquer outro ativo financeiro. Os conteúdos aqui divulgados, são de caráter meramente informativo em relação a Esh Capital e seus produtos e não devem ser entendidos como oferta, recomendação ou análise de investimento ou ativos. Os investidores devem tomar suas próprias decisões de investimento. O investimento em fundos pode resultar em perdas patrimoniais para seus cotistas, podendo inclusive acarretar perdas superiores ao capital aplicado e a consequente obrigação do cotista de aportar recursos adicionais para cobrir o prejuízo do fundo. Para mais informações acerca das taxas de administração, cotização e público-alvo de cada um dos fundos, consulte os documentos do fundo disponíveis no site https://www.eshcapital.com.br/ . Leia atentamente o prospecto e o regulamento antes de efetuar qualquer decisão de investimento. Os investimentos em fundos não são garantidos pelo administrador do fundo, gestor da carteira, de qualquer mecanismo de seguro ou, ainda, pelo Fundo Garantidor de Crédito – FGC. A rentabilidade obtida no passado não é garantia de rentabilidade futura. As rentabilidades divulgadas não são líquidas de impostos. Não há garantias de que fundos multimercados tenham o tratamento tributário para fundos de longo prazo.

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